Vocês se lembram, de To die in Madrid?
Pois é. Trata-se do documentário francês, Mourir à Madrid (1963) dirigido por Frédéric
Rossif: elenco de prestígio, converteu-se em cult — o mais real e dramático enfoque da Guerra Civil Espanhola
— guerra que
dividiria o Ocidente e enlutaria centenas de famílias.1
Entre seus heróis, André Malraux, escritor francês, autor de A condição humana (La condition humaine, 1933),
sobreviveria aos raids aéreos e aos
combates no front: não só lutou e sobreviveu em Madri, como participou da
resistência a Franco, morrendo, de morte morrida, em 1976.
De seu engajamento politico dariam testemunho o romance A esperança (L'Espoir, 1937) e Serra de Teruel (Sierra de Teruel,1945). No
desempenho das funções de Ministro da Cultura (1958/1969, gov. De Gaulle),
realizaria o inadmissível: o resgate, para o presente, da passada grandeza da
capital: fez raspar e limpar as fachadas dos grandes monumentos históricos. Paris se réveille…
Fundou, ainda, as Casas de Cultura (Maisons de la culture), uma para cada cidade, a
fim de permitir o acesso a leitores, estudiosos, artistas e pessoas humildes,
de cada município, às grandes obras do espírito. Ao morrer de sua morte, legava ao país, além de vasta bibliografia, obra pública
irretocável.
Voltemos à nossa própria casa.
Se o Rio é o que canta o coral ianque, posso dizer-lhes, mineira que sou,
estar disposta a morrer no Rio.
Primeiro, porque esse refrão é pra inglês ouvir.
Segundo, porque o Rio nunca deixará de ser a mais bela capital do Novo
Continente. E disputa, com Paris, tal excelência. Exibe, a olhos de ver, a beleza natural de sua baía e suas montanhas, das
alturas dos Dois irmãos, ao alcance
da vista, ao Corcovado e ao Cristo. Dali, em glissado vertiginoso, o
olhar abarca o areal branco de Copacabana, Ipanema, Leblon e Barra. Se o belo é a perfeição, os portugueses o descobriram para o mundo e para
nós, seus herdeiros.
Terceiro, não há, no país, população mais cordial, alegre e solidária que a
carioca. E, tenho certeza, não só criou como pratica o "jeitinho
brasileiro" de ser (que os mineiros me perdoem).
E há mais: conceberam, e realizam, cantando e dançando, a mais bela festa
do mundo — hino multifário, como a banda, coral de celebração da
Diferença, do Plural de todos e da
Euforia de viver.
Saibam que não me serve de SOS o refrão made
nowhere desse blablalá, nem, tampouco, o aviso das placas que se leem nas
passagens de nível: OLHE PARE SIGA.
Depois de ver e admirar nossa baía, extasiado à contemplação da Guanabara (e registrou-o em livro), Stefan
Zweig optaria por morrer, com sua companheira, longe do Rio: parou,
olhou, viu e seguiu para Petrópolis, fugindo de Hitler e do Nazismo...
Também fiz minha opção: não sigo senão a Paris, cidade-luz , por sua beleza
arquitetônica e seu patrimônio histórico. Mas estarei de volta à nossa cidade
maravilhosa. Sempre.
Morrer? Quem há-de salvar-se? Se morreremos todos… Quem escolhe a data?
Onde?
Os heróis da guerra civil espanhola e da Força Expedicionária Brasileira,
composta de voluntários, os nossos “pracinhas”, responderam, ombro a ombro, em
forma, à chamada geral.
A Nossa América pôs-se em marcha, arma em punho, no combate contra o
Eixo, em Monte Cassino e Monte
Castelo, nas Batalhas de Cassino e Castello, em defesa da Europa.
Descansam, agora, em paz: em Pistóia.
É isso aí.
Maria José de Queiroz
Paris, 23 de dezembro de 2013.
===
Frédéric Rossif (1922, Montenegro,
antiga Iugoslávia /1990, Paris). Diretor de filmes e documentários para a tela
do cinema e televisão, colaborou, frequentemente, com o compositor Maurice
Jarre. Depois de perder toda a família durante a Segunda Grande Guerra, emigra
à Itália, estuda em Roma e engaja-se, em 1944, na Legião Estrangeira. Já em
Paris, em 1945, passa a trabalhar no Club
Saint-Germain e dá início à carreira
no cinema. Atua na Cinémathèque
Française, organiza o festival de Vanguarda de Antibes (1949/50) e é contratado,
em 1952, pela ORTF. Seu filme Mourir à
Madrid (script a duas mãos, com a
escritora Madeleine Chapsal) recebe o Prêmio Jean Vigo de 1963, tendo sido
indicado, pela Academia, para o Prêmio destinado ao Documentário do ano. No cast de Mourir
à Madrid, incluem-se, entre outros, Suzanne Flon, Pierre Vaneck, Jean
Vilar, John Gieguld etc. É de 1970, seu único filme não documentário, Aussi loin que l’amour, que teria
Salvador Dalí entre seus atores.