sábado, 27 de agosto de 2022



Não lhe disse que a dor passaria quando estivéssemos na estrada? Não há dor que resista a essa beleza, Joaquina. É o trecho mais bonito da viagem. E olhe que sou tropeiro curtido! depois de pujar esta serra é que se aprende a distinguir o bonito do feio e a formosura da beleza, não estou certo? Lá pelos lados de Toledo, bem próximo do Rio de Janeiro, há um lugar tão bonito quanto este: é a montanha do Pujar da Serra. Sao três quartos de légua do cume à raiz da serra. Para mim, porém, nada há que iguale a esse pujar de Minas. Lá, mais próximo do litoral, a vegetação é mais abundante, mais verde. Mas aqui, as montanhas são de um tom azulado que fariam o nosso desenhista holandês transformar-se em pintor. De mim para mim, cá entre nós, confesso que não sou muito de desenho. A pintura é que é arte, Digo isso o que sinto, sem entender do assunto. O encanto dessa paisagem aqui são as cores. Já imaginaram se tudo fosse preto e branco? 

QUEIROZ, Maria José de. Joaquina, filha do Tiradentes. São Paulo: Marco Zero, 1987. p. 161-162.

sábado, 20 de agosto de 2022

Os livros de Tiradentes



Estendi as peças de roupa no quintal e continuei a abrir arcas e canastras. Deixei por último a canastra dos livros e papéis. Encontrei dois cadernos em que começara a rabiscar as primeiras letras, um caderno de Caligrafia, um livro de Gramática e um de História. Todos destruídos pelas traças. Havia ainda um embrulho com os dizeres: Para Joaquina, filha de Joaquim José. Abri-o. Mais livros e papéis. Os livros: Tratado de cirurgia dos pobres, Tratado das febres intermitentes, Elementos de medicina prática, Dicionário Francês e Latino de Medicina, Manual do moço praticante de cirurgia, Segredos das Artes e Ofícios, Conhecimento prático dos remédios, Enfermidades dos exércitos, Compêndio de Botânica, Conservação da saúde dos povos, Coleção dos remédios fáceis e domésticos, Compêndio de História Natural, Tratado de Mineralogia. Todos intactos. O papel, tratado com verniz e cera, protegera-os contra as traças e o cupim.

QUEIROZ, Maria José de. Joaquina, filha do Tiradentes. São Paulo: Marco Zero, 1987. p. 191.

sexta-feira, 12 de agosto de 2022

NOTA BENE: Joaquina em Dores do Indaiá

Fotografia: Geraldo Amarildo
https://www.instagram.com/geraldoamarildo/

Em 1904 encontramos Joaquina, em companhia da mãe, na cada da avó, na Rua da Ponte Seca. (1) Em 1807, toda a família silva Pais - sua família materna -, transfere residência para Dores do Indaiá. Não há, no entretanto, qualquer referência à presença de Joaquina nesta cidade. João de Almeida Beltrão, filho de Eugênia Joaquina da Silva e do Cadete José Pereira de Almeida Beltrão, assume, surpreendentemente, o papel de filho natural do Alferes, passando mesmo a reivindicar o parentesco para tornar-se seu herdeiro presuntivo. (2)  A partir de 1805 não temos, portanto, qualquer notícia da vida de Joaquina nos registros da família Silvia Pais. A história, por sua vez, esqueceu, sem remorso, o seu rosto, o seu nome e a data da sua morte.

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(1) Consultem-se: Autos da Devassa da Inconfidência Mineira. 2a. ed. Introdução e notas de Herculano Gomes Mathias e Tarquínio J. B. de Oliveira. Brasília: Câmara dos Deputados;Belo Horizonte: Imprensa Oficial de Minas Gerais, 1976 a 1982, v. 1-9.

(2) Autos da Devassa da inconfidência Mineira, 1976 a 1982, v. 3. p. 346-347.



domingo, 7 de agosto de 2022

Música e tradição cultural em Sobre os rios que vão, de Maria José de Queiroz, de Filipe Amaral Rocha de Menezes

No romance Sobre os rios que vão, de Maria José de Queiroz, publicado em 1990, destacam-se vocábulos inerentes ao campo semântico da música como cravelha, harpejo, afinação, pianissimo. O texto, entretecendo referências literárias e bíblicas, narra a história de uma família de judeus búlgaros no Brasil, com seus dilemas e embates, num ambiente cultural repleto dos ditados populares sefarditas, os chamados refranes, e o maravilhoso mundo da música erudita e das oficinas de luteria. Em meio aos nomes das famílias de violinos, Amati, Guadagnini e o preciosíssimo Stradivarius, a família Leite, anteriormente Levi, busca na tradição cultural e na música o seu lugar no mundo, a compreensão de seu passado e o desvelo do presente, em meio a brasilidade. Neste artigo buscou-se observar no texto como a a musicalidade e a tradição cultural representada pelos ditados populares judaico-sefarditas dos refranes compõem a trama que envolve essa família de imigrantes em busca de sua brasilidade, sem deixar de lado sua herança cultural.

Menezes, F. A. R. de. (2020). Música e tradição cultural em Sobre os rios que vão, de Maria José de Queiroz. Arquivo Maaravi: Revista Digital de Estudos Judaicos da UFMG14(26), 36–45. https://doi.org/10.35699/1982-3053.2020.2171

Fonte:  https://periodicos.ufmg.br/index.php/maaravi/article/view/21713