(Cecília Mereles)
Indiferente ao frio
resisti a plural inverno.
No calor de íntimos anelos
fundi a algidez
da neve e do vazio.
Mas de chama vacilante
o sedutor prestígio
incendiou-me os olhos
atraiu-me à luz
despertou-me secreto anseio
de alteridade revestido.
Curiosa e tímida,
entronizei-a,
atenta embora
ao iniludível risco.
Ingênua e submissa
celebrei-a,
rendida ao sortilégio
de fascinantes ritos.
Hoje, entre gelo e granizo,
a alma confundida,
desvivo desequilíbrios,
estarrecida.
De todos os caminhos
fiz encruzilhadas.
Em lúcida aliança
persegui desvios.
Agora, ante o fatal delito,
que me acompanhem
a necessário exílio
artes de fina essência,
olhar e gesto altivo,
neves de rigoroso inverno,
muita saudade, que frio!
Paris, 9-4-70
QUEIROZ, Maria José de. Exercício de levitação. Coimbra: Atlântida, 1971. p. 63-64.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Deixe aqui o seu comentário: