domingo, 31 de dezembro de 2017
domingo, 24 de dezembro de 2017
Ituiutaba, setembro de 1972
Vilarinho no espelho. Herói e Narciso.
As meninas chamam à porta. Para o bonitão, bombons, balas, biscoitos, sabonete e colônia perfumada.
As meninas chamam à porta. Para o bonitão, bombons, balas, biscoitos, sabonete e colônia perfumada.
O passado não conta. Ninguém ressuscita ninguém como aconteceu com Lázaro. O sangue lavou a lembrança dos três corpos massacrados em noite de lua cheia na fazenda de Ituiutaba.
Venham as meninas. Vilarinho aguça as garras. Ri sozinho: tem nova família.
quinta-feira, 30 de novembro de 2017
Maria José de Queiroz, catedrática da UFMG, é homenageada no Rio
Pesquisadores da Fale farão análises da obra da escritora em solenidade no Real Gabinete Português de Leitura

Atualmente
residindo em Paris, na França, a escritora mineira Maria José de
Queiroz, que integra a Academia Mineira de Letras e é professora
catedrática da UFMG, desembarcará no Rio de Janeiro para receber
homenagem no Real Gabinete Português de Leitura (RGPL), nesta
sexta-feira, 1º de dezembro, por seu aniversário de 80 anos. O evento
será aberto às 16h, com entrada franca.
Na ocasião, será exibido o documentário Maria José de Queiroz: artesã da palavra, produzido pelo fotógrafo Lesle Nascimento, em 2013, e apresentado no 5º Colóquio Mulheres em Letras, na Faculdade de Letras da UFMG e na Academia Mineira de Letras. O filme é um registro audiovisual de depoimentos da escritora. Das quase 20 horas de depoimentos tomados de Maria José em Belo Horizonte, Rio de Janeiro e Paris, foram selecionados 37 minutos.
A professora de Literatura e Literatura Comparada da UFMG Lyslei Nascimento, que defendeu dissertação de mestrado sobre o romance Joaquina, filha do Tiradentes, de Maria José de Queiroz, comentará o documentário, e, a seguir, a professora do Real gabinete Ana Cristina Comandulli vai conduzir mesa-redonda com participação dos doutorandos da área de Estudos Literários da Faculdade de Letras da UFMG Maria Lúcia Barbosa, André Souza Pinto, Késia Oliveira e Filipe Menezes.
Os pesquisadores abordarão obras como Joaquina, filha do Tiradentes – que deu origem à minissérie Liberdade, liberdade, exibida pela Rede Globo no ano passado –, Amor cruel, amor vingador (contos), publicada em 1996, Sobre os rios que vão (romance), que narra a história de uma família de origem búlgara e sefardita no interior do estado de São Paulo, e o conto 1789-1790, publicado em Como me contaram: fábulas historiais, em 1973.
Extensa e premiada trajetória
Nascida em Belo Horizonte, Maria José de Queiroz ensinou Língua e Literatura Hispano-Americana na Faculdade de Letras da UFMG, sucedendo a seu mestre e amigo Eduardo Frieiro. Aos 26 anos, tornou-se a mais jovem professora catedrática do Brasil. No exterior, foi professora convidada nas universidades Sorbone, na França, e Harvard e Berkeley, nos Estados Unidos, entre outras.
Publicou mais de 30 livros, muitos deles premiados. Entre suas conquistas estão os prêmios Silvio Romero, de ensaio, da Academia Brasileira de Letras; o Othon Lynch Bezerra de Mello, de ensaio, da Academia Mineira de Letras; o Pandiá Calógeras, de erudição, da Secretaria de Educação do Estado de Minas Gerais; o Luísa Cláudio de Souza, de romance, do PEN Clube do Brasil, e o Jabuti, de ensaio, pela Câmara Brasileira do Livro. Em 2014, foi agraciada com o Troféu Eunice e Dilce Fernandes, outorgado pela Academia Mineira de Letras. Membro da Academia, ela sucedeu a Affonso Penna Júnior, na Cadeira 40, cujo patrono é o Visconde de Caeté.
Catedral da cultura portuguesa
Com 180 anos de existência completados neste ano, o Real Gabinete Português de Leitura é a associação mais antiga criada pelos portugueses do Brasil após a independência, em 1822. Sua sede, construída em estilo neomanuelino e inaugurada pela Princesa Isabel em 1887, guarda cerca de 350 mil volumes, sendo parte significativa de obras raras.
A biblioteca pública funciona como centro de estudos e polo de pesquisas literárias, dirigido e frequentado por professores universitários. Entre as obras raras do Real Gabinete figura um exemplar da edição princeps de Os Lusíadas, de 1572, magnum opus do poeta Luís Vaz de Camões. O Real Gabinete também possui em seu acervo o manuscrito do Amor de perdição, obra do também português Camilo Castelo Branco.
Organizam a homenagem as professoras Lyslei Nascimento, da UFMG, e Ana Cristina Comandulli, do Real Gabinete Português de Leitura.
Neste blog, é possível acessar boa parte da obra de Maria José de Queiroz. Veja também sua página na biblioteca digital Open Library.
Fonte: https://ufmg.br/comunicacao/noticias/escritora-maria-jose-de-queiroz-e-homenageada-no-rio-de-janeiro
Na ocasião, será exibido o documentário Maria José de Queiroz: artesã da palavra, produzido pelo fotógrafo Lesle Nascimento, em 2013, e apresentado no 5º Colóquio Mulheres em Letras, na Faculdade de Letras da UFMG e na Academia Mineira de Letras. O filme é um registro audiovisual de depoimentos da escritora. Das quase 20 horas de depoimentos tomados de Maria José em Belo Horizonte, Rio de Janeiro e Paris, foram selecionados 37 minutos.
A professora de Literatura e Literatura Comparada da UFMG Lyslei Nascimento, que defendeu dissertação de mestrado sobre o romance Joaquina, filha do Tiradentes, de Maria José de Queiroz, comentará o documentário, e, a seguir, a professora do Real gabinete Ana Cristina Comandulli vai conduzir mesa-redonda com participação dos doutorandos da área de Estudos Literários da Faculdade de Letras da UFMG Maria Lúcia Barbosa, André Souza Pinto, Késia Oliveira e Filipe Menezes.
Os pesquisadores abordarão obras como Joaquina, filha do Tiradentes – que deu origem à minissérie Liberdade, liberdade, exibida pela Rede Globo no ano passado –, Amor cruel, amor vingador (contos), publicada em 1996, Sobre os rios que vão (romance), que narra a história de uma família de origem búlgara e sefardita no interior do estado de São Paulo, e o conto 1789-1790, publicado em Como me contaram: fábulas historiais, em 1973.
Extensa e premiada trajetória
Nascida em Belo Horizonte, Maria José de Queiroz ensinou Língua e Literatura Hispano-Americana na Faculdade de Letras da UFMG, sucedendo a seu mestre e amigo Eduardo Frieiro. Aos 26 anos, tornou-se a mais jovem professora catedrática do Brasil. No exterior, foi professora convidada nas universidades Sorbone, na França, e Harvard e Berkeley, nos Estados Unidos, entre outras.
Publicou mais de 30 livros, muitos deles premiados. Entre suas conquistas estão os prêmios Silvio Romero, de ensaio, da Academia Brasileira de Letras; o Othon Lynch Bezerra de Mello, de ensaio, da Academia Mineira de Letras; o Pandiá Calógeras, de erudição, da Secretaria de Educação do Estado de Minas Gerais; o Luísa Cláudio de Souza, de romance, do PEN Clube do Brasil, e o Jabuti, de ensaio, pela Câmara Brasileira do Livro. Em 2014, foi agraciada com o Troféu Eunice e Dilce Fernandes, outorgado pela Academia Mineira de Letras. Membro da Academia, ela sucedeu a Affonso Penna Júnior, na Cadeira 40, cujo patrono é o Visconde de Caeté.
Catedral da cultura portuguesa
Com 180 anos de existência completados neste ano, o Real Gabinete Português de Leitura é a associação mais antiga criada pelos portugueses do Brasil após a independência, em 1822. Sua sede, construída em estilo neomanuelino e inaugurada pela Princesa Isabel em 1887, guarda cerca de 350 mil volumes, sendo parte significativa de obras raras.
A biblioteca pública funciona como centro de estudos e polo de pesquisas literárias, dirigido e frequentado por professores universitários. Entre as obras raras do Real Gabinete figura um exemplar da edição princeps de Os Lusíadas, de 1572, magnum opus do poeta Luís Vaz de Camões. O Real Gabinete também possui em seu acervo o manuscrito do Amor de perdição, obra do também português Camilo Castelo Branco.
Organizam a homenagem as professoras Lyslei Nascimento, da UFMG, e Ana Cristina Comandulli, do Real Gabinete Português de Leitura.
Neste blog, é possível acessar boa parte da obra de Maria José de Queiroz. Veja também sua página na biblioteca digital Open Library.
Fonte: https://ufmg.br/comunicacao/noticias/escritora-maria-jose-de-queiroz-e-homenageada-no-rio-de-janeiro
quinta-feira, 23 de novembro de 2017
quinta-feira, 19 de outubro de 2017
Esse olhar atravessado
Nada passa nesta cidade. Tudo é sempre igual: as pedras da rua, a fachada das casas, as pontes, os chafarizes, as cruzes, os oratórios... Do Caquende até o alto das Cabeças, as caras são as mesmas, desde o tempo do Alferes. Só no Pilar vejo gente estranha: duas ou três pessoas chamam a atenção de todo mundo. Nas procissões, qualquer cara nova é olhada de través. E, agora, sobra, para nós também, esse olhar atravessado. Tem gente que bem que gostaria de me ver enforcada, na mesma corda que enforcou o Alferes. Como essas Pilatas.
QUEIROZ, Maria José de. Joaquina, filha do Tiradentes. Rio de Janeiro: Topbooks, 1997. p. 18-19.
segunda-feira, 16 de outubro de 2017
PEDRA
Concentração de espera
sem partida nem regresso.
Imobilidade resignada
de grave presença
no espaço habitado,
imanência estável,
inviolada.
Além, o mundo:
mistério ocluso,
vedado.
Densidade enclausurada
na intimidade do núcleo,
intacto.
Repouso obrigado,
alheio a todo gesto e parlamento,
ato falhado.
Harmonia compacta,
indiferente a ritmo e melodia,
fermata prolongada.
Acorde perfeito maior,
sustentado.
Pausa de eterno silêncio,
descanso demorado.
Ilha:
cercado de terra,
por todos os lados,
o sonho da pedra:
fantasia reduzida
a verbo limitativo
e modo infinito
- estar.
Ontem, hoje, amanhã,
encerrados no lugar sempre
de coeso e definitivo durar.
sem partida nem regresso.
Imobilidade resignada
de grave presença
no espaço habitado,
imanência estável,
inviolada.
Além, o mundo:
mistério ocluso,
vedado.
Densidade enclausurada
na intimidade do núcleo,
intacto.
Repouso obrigado,
alheio a todo gesto e parlamento,
ato falhado.
Harmonia compacta,
indiferente a ritmo e melodia,
fermata prolongada.
Acorde perfeito maior,
sustentado.
Pausa de eterno silêncio,
descanso demorado.
Ilha:
cercado de terra,
por todos os lados,
o sonho da pedra:
fantasia reduzida
a verbo limitativo
e modo infinito
- estar.
Ontem, hoje, amanhã,
encerrados no lugar sempre
de coeso e definitivo durar.
Interlaken, 1971.
QUEIROZ, Maria José de. Exercício de fiandeira. Coimbra: Coimbra Editora, 1974. p. 41-42.
sexta-feira, 16 de junho de 2017
quinta-feira, 18 de maio de 2017
Maria José de Queiroz entre as 150 mulheres que estão fazendo literatura hoje no Brasil
São Paulo Review é um espaço
colaborativo para críticas, bate-papo, notícias e novidades do mundo da
literatura no Brasil e no exterior, com foco na pluralidade de vozes e
na diversidade cultural.
Direção executiva: Viviane Ka e Alexandre Staut
Direção editorial: Ana Weiss e Alexandre Staut
Colaboradores: Madu Dunker, Sérgio Tavares, Angelo Mendes Corrêa, Itamar Santos, Ronaldo Cagiano, Eduardo Sabino, Ricardo Bellissimo, Ricardo Biazotto, Raimundo Neto, Paulo Vasconcelos e Paulo Ribeiro

sexta-feira, 14 de abril de 2017
Homenagem a Maria José de Queiroz na Academia Mineira de Letras, 18 de abril de 2017
A Academia Mineira de Letras realiza na terça-feira, dia 18, às 19h30,
sessão em homenagem à acadêmica Maria José de Queiroz, ocupante da
cadeira de numero quarenta. Vivendo atualmente em Paris, como professora
da Sorbonne, ela virá a Belo Horizonte especialmente para a solenidade.
O evento faz parte do programa Universidade Livre, realizado pela Lei
Federal de Incentivo à Cultura, com patrocínio do Instituto Unimed-BH,
por meio do incentivo fiscal de mais 4,5 mil médicos cooperados e
colaboradores. A AML integra o Circuito Liberdade.
Maria José de Queiroz nasceu em Belo Horizonte, em 1934. É doutora em Letras Neolatinas pela Universidade Federal de Minas Gerais e autora das obras “Joaquina, filha de Tiradentes” (recentemente adaptada para a televisão), “Como me contaram”, “Ano novo, vida nova”, “Homem de sete partidas”, entre outros romances e obras poéticas.
Aos 26 anos, se tornou a mais jovem catedrática do país e, por concurso, substituiu o professor Eduardo Frieiro na UFMG. Em 1953, começou a colaborar em jornais em Minas Gerais e hoje escreve para importantes periódicos, inclusive o francês Le Monde. Possui uma longa carreira como professora convidada em importantes universidades americanas e europeias: Indiana, Harvard, Berkeley, Sorbonne, Lille, Bordeaux, Ainx-en-Provence, Bonn, e Colônia. No evento, Maria José de Queiroz será saudada pela presidente da Academia Mineira de Letras, a acadêmica Elizabeth Rennó, pelo secretário de Estado da Cultura, acadêmico Ângelo Oswaldo de Araujo Santos, e apresentada por uma das mais importantes estudiosas de sua obra, a professora Lyslei Nascimento.
Lyslei Nascimento é professora de literatura na Faculdade de Letras
da UFMG. É mestre em Literatura Brasileira, doutora em Literatura
Comparada pela Universidade Federal de Minas Gerais e pós-doutora pela
Universidade de Buenos Aires e pela Universidade de São Paulo.
Atualmente é subcoordenadora do Programa de Pós-Graduação em Estudos
Literários e Coordenadora do Núcleo de Estudos Judaicos da UFMG.
Pesquisadora do CNPq e da Fapemig, publicou, entre outros títulos, Borges e outros rabinos, 2009, pela Editora da UFMG.
Em dissertação apresentada ao curso de Pós-graduação em Letras e intitulada “Exercício de fiandeira: Joaquina, filha de Tiradentes, de Maria José de Queiroz”,
Lyslei faz uma análise do mencionado romance de Maria José, que
abrange os fatos históricos do século XVIII e a construção da vida
ficcional da filha do herói da Inconfidência.
Ainda na sessão, será exibido trecho de documentário sobre Maria José de Queiroz.
SERVIÇO:
Sessão em homenagem à acadêmica Maria José de Queiroz
Data: 18 de abril
Horário: 19h30.
Local: Academia Mineira de Letras (Rua da Bahia, 1466 – Lourdes – BH/MG).
Entrada gratuita.
academiamineiradeletras.org.br
domingo, 19 de março de 2017
Humor do sofrimento
![]() |
Prometeu (1610-1611), Peter Paul Rubens |
Num ensaio recente, "Dostoievski, a escrita do sofrimento e do perdão", Julia Kristeva aprofunda o tema freudiano da impulsão à morte" e do "masoquismo primário", ausentes dos estudos de Freud sobre o autor de O Idiota. Em vez de transformar-se em impulsões eróticas, a "impulsão à morte" se resolve em Dostoievski, segundo Kristeva, num "humor do sofrimento". À borda da ruptura entre o Eu e o "outro", antes mesmo que a ruptura se verifique, manifesta-se o "sofrimento dostoievskiano". E a verdadeira volúpia que experimenta nada tem a ver, aos olhos da ensaísta, com a melancolia e a impulsão do abismo que ressuma das páginas de Gérard de Nerval.
Convenha-se: a exaltação desse sentimento, apontado apenas nos grandes místicos - para os quais a dor é meio eficaz para alcançar a "via unitiva"- leva à jubilação gozosa.
QUEIROZ, Maria José de. A literatura alucinada: do êxtase das drogas à vertigem da loucura. Rio de Janeiro: Atheneu Cultura, 1990. p. 87.
sexta-feira, 17 de março de 2017
Os 31 livros de Maria José de Queiroz
Fotografia dos 31 livros de Maria José de Queiroz, na palestra na Faculdade de Letras da UFMG.
O Brasil não conhece o Brasil.
quinta-feira, 16 de março de 2017
domingo, 26 de fevereiro de 2017
Limites
Euclides, vivo, incomodava a todos. Tivera êxito nos negócios, gozava de excelente fama entre as mulheres... que mais queria? É isso que importa! Nadie o entendia. Ele inquietava e escandalizava. Suas ambições escapavam ao homem comum. À força de agitar-se, de agir, de angustiar-se, foi longe demais: alcançou o proibido. Sempre me repetia que o seu maior desejo era conhecer seus própios límites: queria saber até onde iria. Em tudo. Falta sempre alguma coisa ao homem que jamais experimentou essa vertigem, confessou-me certa vez. Nesse dia, ele chegara a um dos seus abismos: o da fúria homicida. Um dos seus empregados abusara de uma indiazinha. Euclides foi procurá-lo: ele tinha de reparar o crime. O empregado, cínico, replicou que apenas se antecipara ao pai, aos irmãos ou à indiada suja que, em obediência ao hábito, se encarregariam de fazê-la mulher. Ela, índia, devia-lhe um privilégio: ele, branco, dera-lhe a provar o gosto do sexto de uma raça superior. Euclides, fora de si, atirou-o ao chão. Ao vê-lo por terra, seu primeiro ímpeto foi matá-lo, à frio. Quase sucumbiu à tentação. Era o seu límite. Vencida a vertigem, pôs o revólver na cintura. A mão direita em garra, presa ao pescoço do homem, levantou-o para aplicar-lhe punição mais eficaz: com um pontapé vigoroso, privou-o, vitaliciamente, de iniciar nos mistérios do sexo índias e brancas, sem discriminação de raça.
QUEIROZ, Maria José de. Homem de sete partidas. Rio de Janeiro/São Paulo: Record, 1999. p. 220.
terça-feira, 21 de fevereiro de 2017
O canto do cisne
Não, o cisne não canta
ao aviso da morte.
Nenhuma voz anima
o seu último silêncio
na solidão das águas.
No bico secreto,
com timbre preciso,
o peixe ágil,
o lodo, o verme.
No momento inacessível
em que os juncos adormecem,
o seu pescoço se alonga
à procura de outra forma.
É o cisne o seu próprio canto
no risco definitivo
do corpo sem metáfora.
QUEIROZ, Maria José de. Resgate do real: amor e morte. Coimbra: Coimbra Editora, 1978. p. 68.
domingo, 22 de janeiro de 2017
Yehudá Abrabanel
Yehudá Abrabanel (nome que o próprio escritor trocaria por León Hebreo - leão, atributo da tribo de Judá; hebreo, pela sua religião) nasceu em Lisboa, entre 1460-65. Era filho do célebre Isaac Abrabanel, uma das maiores figuras do judaísmo. Foi com o pai que se iniciou na filosofia e na teologia. Foi médico de profissão e como a astrologia se confundia com os estudos de medicina, sua obra está marcada pelos estudos dos astros e sua influência na vida dos homens.
QUEIROZ, Maria José de. A América: a nossa e as outras. Rio de Janeiro: Agir, 1992. p. 106.
sábado, 14 de janeiro de 2017
Qual flor sem haste
![]() |
Vicente Huidobro |
QUEIROZ, Maria José de. A América sem nome. Rio de Janeiro: Agir, 1997. p. 141.
terça-feira, 10 de janeiro de 2017
Nunca houve, nem haverá, uma cidade como Berlim
Nunca houve, nem haverá, uma cidade como Berlim. Tive a impressão de que estávamos na véspera do fim do mundo. Abraham me repetiu um dia a frase de uma amiga sua: "Aqui, uma mulher custa um cigarro e um quilo de pão, um milhão de marcos". Mas não era só a mulher: o homem também valia pouco. O que custava caro era a comida. Num cartaz de cabaré, li e anotei esta frase formidável: "Berlim, teu parceiro de dança é a morte". E a morte veio com a guerra. Tudo o que aconteceu depois você já sabe. Faz parte da história: os conflitos entre nazistas e comunistas, os desfiles de rua e o fatídico 10 de maio, quando Goebbels e os estudantes lançaram ao fogo milhares de de livros. Quando a Alemanha foi invadida eu já estava no Brasil.
quarta-feira, 4 de janeiro de 2017
Folha dilacerada
Num quarto de hotel, sozinha, às dez da noite, a desenterrar suas mágoas. Rasgou a arenga larga. Em dois pedaços. Depois, em quatro. Logo, em oito. Quis, então, reler uma frase. Dispôs com atenção a folha dilacerada sobre a cama. Logrou, a pouco e pouco, recuperar todo o texto. O seu quebra-cabeça estava armado. Excelente distração para a noite que se anunciava longa e insone. Rearticulou períodos e parágrafos. Tudo bem encadeado. Para que as seis páginas se dispusessem, sem prejuízo para a leitura, em toda a sua extensão, transportou-as para a mesa, firme e plana. Miudamente, com prazer masoquista, dividiu em dois cada pedacinho de papel. E voltou a armar quatro, cinco, diversas vezes, as seis folhas. Página por página. Avesso e direito, alternadamente.
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